segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Opinião "1793", Niklas Natt och Dag

Sinopse

1793, Estocolmo. Quatro anos após a tomada da Bastilha e mais de um ano depois da morte de Gustavo III da Suécia, as guerras estrangeiras esvaziaram os tesouros e a nação é governada com mão de ferro pelo senhor do reino. Na esteira do falecimento do velho rei, a confiança transformou-se num bem escasso. A paranóia e as conspirações sussurradas abundam em todos os cantos. Uma promessa de violência estala no ar enquanto os cidadãos comuns se sentem cada vez mais vulneráveis aos caprichos dos que estão no poder.

Quando Mickel Cardell, um ex-soldado aleijado e ex-guarda nocturno, encontra um corpo mutilado flutuando no lago malcheiroso da cidade, sente-se compelido a dar um enterro condigno ao homem não identificado. Para Cecil Winge, um brilhante advogado que é também detective consultor na Polícia de Estocolmo, um corpo sem braços, pernas ou olhos é um enigma formidável e uma última oportunidade de acertar as coisas antes de perder a sua batalha com a morte. Juntos, Winge e Cardell vasculham Estocolmo para descobrir a identidade do corpo, encontrando o lado sórdido da elite da cidade.

No seu romance de estreia, 1793, Niklas Natt och Dag pinta um retrato convincente do final do século XVIII em Estocolmo. Através dos olhos dos diferentes narradores, o verniz em pó e a pintura da época são retirados para revelar a realidade assustadora, mas fascinante, escondida além dos factos secos dos textos de História.

Com um pé firmemente cravado na tradição literária e outro na literatura de suspense, Natt och Dag cria um género inteiramente novo de thriller histórico sugestivo e realista. Retrata a capacidade de se ser cruel em nome da sobrevivência ou da ganância — mas também a capacidade para o amor, a amizade e o desejo de um mundo melhor.


Opinião

1793, romance de estreia de Niklas Natt och Dag, fenómeno editorial nomeado para vários prémios e vencedor de outros tantos, é um thriller histórico que retrata Estocolmo no final do século XVIII. Andava muito curiosa com este livro e a Suma de Letras respondeu carinhosamente ao meu apelo, como aliás sempre faz, e enviou-me este livro sui generis.

1793 é um livro diferente, com um clima que me fez lembrar O Perfume, de Patrick Süskind, por apelar muito aos sentidos, por ser visceral e repugnante, mas simultânea e infelizmente ser genuinamente um reflexo da podridão humana.

Mickel Cardell, guarda, ex-soldado, sofrendo a dor fantasma de um braço perdido em esforços bélicos, encontra um cadáver macabramente mutilado flutuando num lago da cidade. Cecil winge, um homem da razão, um advogado incorruptível que tenta perceber os seus criminosos, e também membro honorário da polícia, é convidado a tentar desvendar este mistério assombroso, ao mesmo tempo que luta contra o relógio tentando enganar o cronómetro da morte; tuberculoso, é entre os ataques de tosse e golfadas de sangue que cria uma espécie de amizade com Cardell, juntos procuram a resposta para o enigma do homem encontrado sem braços, pernas, línguas ou olhos, metodicamente removidos e de forma espaçada.

(Engraçado ver a resolução de um crime sem recolha de provas forenses ou análises de DNA!)

A narrativa está dividida em quatro partes sendo que a primeira e a última se focam nestes nossos dois protagonistas. Os capítulos centrais dão-nos a conhecer Kristofer Blix, um pateta alegre com sonhos mas com azar, muito azar, e Anna Stina, uma rapariga forte e destemida, condenada injustamente por um crime que não cometeu. As suas lastimáveis vidas são usadas por Niklas Natt och Dag para nos dar um retrato fiel de como as pessoas viviam na penúria, lutando para sobreviver nas ruas fedorentas, escuras, sujas e frias, repletas de crueldade, morte, doença, fome, escravização, corrupção e injustiça fruto da grande instabilidade política vigente.

Este não é um livro para pessoas fofinhas, é um livro violento, macabro, entre o gore e o noir, que nos transporta para um cidade fria, mal-cheirosa, onde reina a devassidão e o desespero, um autêntico purgatório, onde os laivos de Amor e Amizade existem, mas têm de ser procurados com muito afinco. É criada uma atmosfera tão tensa que nos vemos obrigados a inspirar fundo várias vezes. Numa sociedade destituída de valores, como aquela que nos é apresentada, a vida humana não vale muito e os mais poderosos têm carta-branca para todo tipo de atrocidades.

Reconheco a Niklas Natt och Dag um imenso e exaustivo trabalho de investigação e lamento que eu seja uma nulidade em cima de uma nódoa no que diz respeito a factos históricos, e por isso sinto que não apreciei em pleno tudo de bom que este livro tem. Algumas descrições de espaços foram-me difíceis de imaginar o que ocasionalmente quebrou o ritmo de leitura.

A nível gráfico só um reparo quanto ao tamanho de letra que sendo muito pequeno torna a leitura cansativa o que no início me fez demorar a avançar.

Já acabei de ler 1793 há alguns dias e ainda não sei se o final me agradou totalmente, mas sabemos que um livro é bom quando continuamos a pensar nele e a remoer e a digerir sobre as vidas que ele nos deu a conhecer .

A Amizade entre Winge e Cardell e a determinação da Anna Stina são o efeito de tyndall a entrar por um lugar há muito emergido nas trevas. A Esperança personifica-se nestes protagonistas num livro que nos que nos deixa tão atónitos durante a leitura que parece que perdemos o discernimento para julgar o certo e o errado.

Um grande livro, uma leitura perturbadora e viciante. Visceral e sangrento, um thriller memorável!

 

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