quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Opinião - "Postmortem", Patricia Cornwell

Formato: Ebook
Edição: 2009 (1ª 1990)
Páginas: 215
ISBN: 9781439187517
Goodreads: mais informação aqui.

Sinopse


“Under cover of night in Richmond, Virginia, a human monster strikes, leaving a gruesome trail of stranglings that has paralyzed the city. Medical examiner Kay Scarpetta suspects the worst: a deliberate campaign by a brilliant serial killer whose signature offers precious few clues. With an unerring eye, she calls on the latest advances in forensic research to unmask the madman. But this investigation will test Kay like no other, because it's being sabotaged from within and someone wants her dead.”


Opinião


Andava já há muito para ler uma das aventuras da Dra. Kay Scarpetta, a famosa médica legista. (Caía na lista interminável de livros que “um dia” havia de ler.) Tenho alguns outros volumes traduzidos, mas queria começar pelo primeiro, e acabei por optar pelo ebook.

Kay é uma mulher num mundo de homens – apesar da sua experiência e competência, e de ser a Chefe do Instituto de Medicina Legal do estado da Virginia, é ainda olhada de lado por alguns dos que trabalham consigo. Mas para Kay as coisas nunca haviam sido fáceis – já na Faculdade de Medicina fora uma das únicas mulheres a acabar o curso, sem ajuda de qualquer um dos seus colegas. Mesmo na vida pessoal, os homens do seu passado não lhe trazem memórias felizes: quer o seu pai, por adoecer e morrer quando ainda era criança, quer o ex-marido, que Kay menciona apenas ao de leve, dando a entender que era abusivo.

Com uma mãe que a sufoca e uma irmã que dá mais atenção à sua vida social e aos seus livros infantis que à própria filha, resta a Kay apenas esta, Lucy, uma criança de um intelecto muito superior ao esperado para a sua idade, mas que vive com uma carência de afecto parcialmente colmatada pelas férias que passa em casa da tia.

Como policial, o livro é bastante bom. Há um assassino em série em Richmond, cuja violência aumenta de caso para caso. Kay colabora com o Agente Benton Wesley, um profiler do FBI, e com o Sargento Pete Marino, da polícia local, para tentar apanhar o elusivo criminoso. À medida que os seguimos vamos apanhando peças do puzzle que nem sempre encaixam, e somos levados a tecer várias teorias acerca do mistério, tal como os investigadores, para depois termos de as desconstruir para fazer encaixar cada nova pista.

Nesta vertente salta à vista o facto de o livro ter sido escrito e publicado há mais de 10 anos: a identificação pelo DNA é um método ainda embrionário e moroso, e a equipa usa todos os outros métodos possíveis para descobrir a identidade do assassino; para além disto, também o facto de a informatização dos processos ser algo relativamente novo, e de os computadores serem seres complicados, com necessidade de conhecimento específico para serem manipulados, nos leva atrás no tempo e nos desconcerta um pouco.

Para além do assassínios, como se já não fossem suficientes para perturbar Kay emocionalmente (embora esta o negue, pois sempre foi sua política distanciar-se dos casos em que trabalha), esta vê-se a braços com uma falha na segurança dos dados informatizados que pode comprometer a investigação, e pôr o seu próprio cargo e credibilidade em risco.

À primeira vista, Kay era uma personagem com quem me iria identificar naturalmente – (quase) partilhamos a profissão, e apesar de as mulheres já ultrapassarem os homens em número na nossa área, ainda há sinais do machismo que Kay tenta combater, tanto na Medicina como na sociedade em geral. No entanto, não consegui empatizar devidamente com a Dra. Scarpetta, excepto num ou outro momento da narrativa. Achei a personagem um pouco incoerente em algumas das suas atitudes, e por vezes algo arrogante e demasiado auto-indulgente. Para além disso, tem um comentário com um toque de homofobia que me incomodou profundamente, e, apesar de ser mais “desculpável” pela época em que se passa a história, há racismo implícito numa cena específica. Isto levou-me a fazer alguma pesquisa, e pelo que me parece a autora não comunga das opiniões da sua personagem principal, e a verdade é que Kay apenas dá voz a opiniões generalizadas da população na altura, mas que não me caíram muito bem. Outra questão cultural que me fez uma certa espécie – Kay não encontrou qualquer problema em servir vinho à sua sobrinha de 10 anos em duas ocasiões distintas! 

Para terminar os aspectos negativos, não consigo deixar de mencionar uma incorrecção científica, que possivelmente não o seria na altura – é dito em mais que uma ocasião que os psicopatas, ou indivíduos com distúrbio de personalidade antissocial, têm uma inteligência acima da média. Isto não é totalmente correcto – podem ter ou não, como qualquer pessoa.

Na verdade, a parte mais interessante da personagem principal é o seu relacionamento com as personagens secundárias, nomeadamente Lucy e Marino. A primeira, em si, é fascinante – Cornwell consegue não torna-la no cliché da criança sobredotada que se comporta como um adulto em ponto pequeno, mas sim uma menina com problemas de comportamento decorrentes de uma vida familiar desestruturada, que se refugia até certo ponto na busca de conhecimento. 

Com Marino acontece o oposto de Kay – um detective “old school”, machista q.b., muito pouco virado para os desenvolvimentos tecnológicos… podia ser uma personagem odiável, mas, na minha opinião, é muito mais consistente e bem construído do que a própria Scarpetta. A constante luta de vontades entre os dois parece mover a narrativa, e percebemos que apenas o facto de ambos serem extremamente bons no seu trabalho (e se respeitarem pelo menos profissionalmente) e de terem o objectivo comum de fazer justiça impede a ruptura total entre eles. 

Estes são exactamente os motivos pelos quais acabei por gostar da vertente mais pessoal do livro, para além da investigação do caso, e pelos quais pretendo continuar a ler a série – Marino e Scarpetta completam-se e fazem uma dupla de investigadores excelente.


1 comentário :

  1. Olá,

    Penso já ter lido algo desta escritora e ter gostado bastante, alias este é um genero de livro que me agrada :)

    Excelente comentario

    Bjs e boas viagens

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