terça-feira, 23 de agosto de 2016

Opinião "A Gravitação do Amor", Sara Stridsberg

Sinopse:

“Quando Jimmie Darling é admitido no hospital psiquiátrico Beckomberga, nos arredores de Estocolmo, a sua filha Jackie começa a passar cada vez mais tempo na instituição, até ela se tornar todo o seu mundo quando a mãe parte numa viagem de férias.

No hospital conhecemos o médico responsável, Edvard Winterson, que às vezes leva Jimmie e outros doentes a grandes festas na cidade. «Uma noite passada fora do recinto do hospital torna-vos novamente humanos», diz ele.

Conhecemos também Inger Vogel, uma «enfermeira angélica de socas», que parece habitar um mundo entre a ordem e a devastação, bem como a doente Sabina, objeto dos desejos tanto de Jimmie como de Edvard, com as suas contas coloridas e a sua obsessão com a liberdade e a morte.

A Gravitação do Amor, um livro de uma beleza arrasadora, explora o amor de Jackie por Jim e o modo como tenta aproximar-se dele, tanto em criança como em adulta e já mãe, tendo sempre como pano de fundo Beckomberga, na sua dimensão quase mítica de anjo punidor e de redentor de espíritos atormentados.”


Opinião:

Existem obras que, sem sabermos muito bem o motivo, nos chamam a atenção. E esta é sem dúvida uma delas. Com uma capa misteriosa, um título pouco revelador, e uma sinopse interessante capaz de despertar a mínima curiosidade no leitor, foi com grande emoção que enveredei nesta leitura proporcionada pela Bertrand Editora, a quem deixo aqui desde já o meu agradecimento.

No entanto, não esperava que a leitura fosse tão diferente daquilo que pensava. Penso que esta obra não irá agradar a todo e qualquer leitor, no entanto, considero que todos os leitores deveriam passar os olhos pela mesma. Com uma escrita fluída e directa, capítulos curtos, Sara Stridsberg demonstra ao leitor a importância de um testemunho como este.

Para quem não sabe, a história desenrola-se em torno de um hospital psiquiátrico – o hospital de Beckomberga – durante os anos de 1932 e 1995. E logo pelo tema, muitos leitores ficarão de pé atrás em relação a esta leitura, mas por essa mesma razão é que a recomendo apesar de tudo, pois até para mim que já tenho algumas noções da Psiquiatria esta ensinou-me bastantes coisas:

- Ensinou-me a ser paciente – foi com algum vagar e confusão que fui lendo esta obra. Não trazendo consigo os temas mais apelativos, nem o ritmo alucinante que caracteriza tantos outros, devagar devagarinho fui acompanhando a vida de Jackie, do seu pai Jimmie, da sua mãe Lone e de tantas outras personagens que passaram pela vida de cada um. Mas aqui, o leitor é um mero expectador, incapaz de intervir e tomar parte da narrativa. É como se estivéssemos do lado de fora do vidro a assistir não a um filme que passa rápido, mas a toda uma vida num hospital psiquiátrico de forma lenta.

- Ensinou-me que a Psiquiatria é ainda mais do que eu achava que era, demonstrou-me como ninguém o que é o ponto sem retorno, o que é a falta de vontade de viver, ou melhor, ensinou-me que por vezes não existe sequer motivo para tal para certas pessoas. E o que mais me custou durante esta leitura foi exactamente aquilo que referi anteriormente – Eu só podia assistir! No entanto, sei que a minha intervenção não faria diferença! Porque houve quem tentasse intervir, porque por muito que para Jim não parecesse, Jackie amava-o. 

- E tenho a certeza que muito ficou por ensinar!

Apesar de não ter sido a leitura que eu queria e esperava, a verdade é que dei por mim com saudades dele, e sinto que um dia vou querer relê-lo. Não porque a história seja bonita, não porque me tenha feito sorrir, mas porque me fez ver a vida com outros olhos, porque me fez encontrar a peça que me faltava no mundo da Psiquiatria, peça que preciso e que sei que vou precisar no meu dia-a-dia.

Assim, não posso dizer “Leiam que vale muito a pena”, porque iria provocar muitas desilusões. Mas posso dizer “Leiam, sabendo o que vos espera; Leiam, sabendo que vão ser meros expectadores de um hospital psiquiátrico e das pessoas que nele viveram”.



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