sábado, 10 de abril de 2021

Novidades - Rute Simões Ribeiro

Quem segue o Bloguinhas Paradise sabe que euzinha sou muito fã da autora Rute Simões Ribeiro, por isso, é com muita alegria que partilho convosco as suas duas últimas obras publicadas recentemente.



Choram Mães-Casa seus Filhos-Metade sucede à obra A Revolução dos Homens Sentados e apresenta sete breves histórias que franqueiam, sem concederem à amenidade, a violenta vivência, ainda hoje, de muitas crianças em vários lugares do mundo. São textos-nus, de força crua, inexoráveis, não complacentes com o esquecimento. Rute Simões Ribeiro transporta para a literatura a verdade sem ambiguidade e sem transformação, a não ser a da estética humanista do quase-poema. Desobediente uma vez mais a convencionalismos literários ou sequer deles consciente, a autora impõe aos textos somente o ritmo da rudeza e o fôlego da sensibilidade que dessa brutalidade se extrai, concluindo-se em narrativas breves delicadamente cruas, irredutivelmente humanas. Não obstante exalarem os textos reais existências na mais dura das suas possibilidades, a autora nunca compromete o lugar da literatura, antes a exalta à função de consciência. O livro recorda, em diversas citações, a Convenção sobre os Direitos das Crianças, a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a Convenção de Genebra relativa ao Estatuto dos Refugiados. Constrange o leitor ao desassossego da humanidade que nele se agite e dificilmente se separará do que for capaz de transpor as suas páginas. Encontra-se nesta série o texto O Naufrágio, que integrou os microcontos nacionais finalistas selecionados pela Escrever Escrever, no âmbito do European Association of Creative Writing Programmes (EACWP) Flash Fiction Contest III Ed. 2020.
 
 

 
O Homem Que Sonhou é um texto que convida o leitor a encenar no seu imaginário o julgamento – noturno, onírico – de um homem pela sua atividade de ideação dissonante da “Instituição”, que a todos garante a suficiência, na condição da contenção imaginativa. Apresentam-se outras personagens, entre elas, “o homem que segue ao lado”. O caso julgado encerrar-se-ia com uma declaração de inocência, com a contrição da consciência. Contudo, o homem que sonhou não se destitui da ideia sonhada e decide declarar-se culpado do seu crime de consciência. O seu advogado de defesa procurará, num primeiro momento, persuadi-lo a revogar consciência e o advogado da instituição solicitar-lhe-á que silencie ofensas ideológicas, pois a Instituição “conhece a força da escolha em não advogar por uma ideia sonhada” e sempre lhe agradecerá “o sacrifício da palavra oculta”. O juiz, que pede a estabilidade ideológica, face à contaminação “de ideias sonhadas e por sonhar”, virá, porém, a tomar uma decisão inesperada, inevitável no curso do confronto das ideias com elas mesmas. Convocando um elogio à ignorância que se conhece e sujeitando os pressupostos em juízo à prova da reflexão e ao diálogo relacional (do indivíduo com os outros e consigo próprio), num exercício que recordará a dialética socrática, a interrogação abrirá os dialogantes à verdade completa e à justiça como ela é. Este texto quase-dramatúrgico, se é estruturado como uma peça de teatro, apresenta, porém, marcadores na palavra escrita, para além de usar uma oratória inextricavelmente literária, estética e filosófica. Se as peças de teatro se escrevem para serem ditas, esta será, antes, uma exercitação quase-teatral, a encenar intimamente, e que existe, em primeiro lugar, para ser, na interioridade, lida. 



Podem ler a minha opinião das outras obras de Rute Simões Ribeiro aqui.

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